O trabalho intitulado “Evidências empíricas dos efeitos dissuasórios da
maioridade penal no Brasil” apontou que o número de homicídios cometidos por
menores pode ser reduzido em 63% e a reincidência em 20% caso os infratores
passem a receber punições mais severas. Para fazer a estimativa foram
utilizadas informações de prisões realizadas pelas polícias civil e militar do
Rio de Janeiro nos anos de 2016 e 2017.
O estudo usa como base o modelo
de crime e punição do professor Gary Becker da Universidade de Chicago. Segundo os trabalhos do norte-americano, que
foi Prêmio Nobel de Economia de 1992, potenciais criminosos respondem de forma
racional e consistente a incentivos. Assim sendo, quanto maior a probabilidade
de punição e mais severa for a pena em relação aos benefícios dos crimes, maior
a capacidade de dissuasão para que indivíduos não migrem para atividades
criminosas.
No período analisado, foram realizadas 59.126 prisões no Rio de Janeiro
nas quais se tinha informações sobre o tipo e a data da ocorrência do crime,
além de informações a respeito do suspeito, tais como idade, sexo, raça e
origem. Os crimes foram classificados em 55 tipos diferentes. A maioria, diferentes
tipos de furtos e roubos. Com base nas características dos suspeitos, foi
possível identificá-los e construir um banco de dados com o histórico dos
indivíduos. Assim, foi possível saber, entre outras coisas, se o criminoso era
reincidente, que tipo de crimes cometeu e o tempo transcorrido entre cada
reincidência. Deste modo, foram identificados 36.782 indivíduos, dos quais
19,31% apresentaram mais de um registro em datas diferentes, ou seja,
reincidiram no período de 18 meses.
Os menores de 18 anos que cometem crimes são regidos pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA). Ele prevê sete tipos distintos de advertências
e punições, com duração de até três anos. A punição mais severa é a internação.
Neste caso, crimes são tratados como “atos infracionais”. Aos 18 anos,
portanto, todos os brasileiros são considerados réus primários. Os maiores de
18 anos, por sua vez, são regidos pelo Código Penal, que prevê três regimes de
punição (aberto, semiaberto e fechado), com duração de até 30 anos.
Dessa forma, um menor julgado pelo crime de tráfico de drogas pode ter
uma punição de até três anos, mas a internação não é obrigatória no primeiro
ato infracional, conforme entendimento do STJ. Assim, apenas 17% dos menores
infratores são internados, e por períodos que raramente ultrapassam os 3 meses.
Já menores que praticam homicídio qualificado podem ficar internados por até
três anos, mas a média de internação é de apenas nove meses, segundo o estudo.
Os mesmos crimes, quando julgados pelo Código Penal, são punidos com
muito mais severidade. O crime de tráfico, por exemplo, tem pena de cinco a 15
anos de reclusão, além de pagamento de 500 a 1.500 dias-multa. Em média,
pessoas condenadas por tráfico são sentenciadas a dois anos de reclusão. Já o
homicídio qualificado pode render de 12 a 30 anos de prisão, mas os criminosos
ficam no regime fechado por 4,8 anos, em média.
De acordo com o estudo, há um crescimento de prisões por tráfico e
homicídio entre menores de até 17 anos, quando se observa um pico. Ou seja, os
indivíduos de 17 anos são os que mais cometem crimes de tráfico de drogas e
homicídios no período e local analisados pelo estudo. Depois do 18º
aniversário, há uma queda nos crimes.
Diante desses números, o estudo sugere que um aumento de punição para
uma pena mínima de dois anos de prisão por tráfico de drogas (lembrando que
hoje a pena máxima é de 3 meses de internação) é capaz de reduzir este tipo de
crime de 6,16% a 6,88%. Já para o crime de homicídio, um aumento de punição
para pelo menos quatro anos e dez meses em regime fechado seria capaz de
reduzir este tipo de crime de 63,28% a 64,15%. As prisões de menores por
homicídios dolosos representam cerca de 14% das 5.033 ocorrências deste tipo
registradas no Rio de Janeiro em 2016. Assim, uma redução de 70% implicaria em
uma redução aproximada de 10% no total dos homicídios cometidos, isto é, cerca
de 500 homicídios poderiam ser evitados por ano.
No mundo a maioridade penal é de 10 anos no Reino Unido, 14 anos na
Alemanha, 15 anos na Suécia e Noruega, e 17 anos na Polônia. Há países em que a
maioridade é de apenas 7 anos, como na Tailândia, Índia, Paquistão, Nigéria e
Sudão. Na maior parte da América Latina ela é de 18 anos, tendo como exceção o
Chile, onde a maioridade penal é de 14 anos.
Fonte:
Gazeta do povo